Alfonso Daniel Rodríguez Castelao, Sempre en Galiza (1944), p. 24 (no final do capítulo IX do «Adro»). Meme do Orgullo Galego, tirado da sua página do Facebook (2023-01-07).
É fácil ver que, com pequeníssimos ajustes ortográficos e estilísticos, a língua portuguesa não é senão a língua galega com outra vestimenta. Vou usar um excerto de um texto de Castelao para tentar mostrar isso.
[Castelao foi um escritor e activista galego da primeira metade do século XX. E não falta nenhum til ao nome: é mesmo para se ler Castelau, como bacalhau; se fosse para ser Castelão teria de ficar Castelán ou Castelom na ortografia galega.]
Em 1 temos o texto original, tal como aparece no meme. Em 2 temos apenas a substituição do x por g, do n final por m, do z por ç, do s único intervocálico por ss, e a colocação do hífen nos verbos pronominais. Em 3 temos a transformação do om em ão, e da 2.ª pessoa do plural tradicional para a forma consagrada nas gramáticas normativas (uso do centro-sul de Portugal, Brasil e restantes países) ― e já é português dito correcto! Podia ter parado aqui. Mas fui um bocadinho mais longe: em 4 fiz mais umas minúsculas mudanças para melhor compreensão, e em 5 pus como seria mais usual dizer-se no uso moderno, com a 3.ª pessoa dos verbos a fazer vez da 2.ª.
1. «Irmáns: Fuxide sempre dos parvos. Non vos arrimedes a eles, porque poden roubarvos algo da vosa razón e transmitirvos a súa parvada. Deixádeos pasear, falar, danzar e medrar no seu mundo. E se algún parvo chega a ser autoridade non mostredes asombro, porque son cousas do sistema que combatimos e dos tempos en que nos cadrou vivir.»
2. «Irmans: Fugide sempre dos parvos. Nom vos arrimedes a eles, porque podem roubar-vos algo da vossa razom e transmitir-vos a sua parvada. Deixade-os passeiar, falar, dançar e medrar no seu mundo. E se algum parvo chega a ser autoridade nom mostredes assombro, porque som cousas do sistema que combatemos e dos tempos em que nos quadrou viver.»
3. «Irmãos: Fugi sempre dos parvos. Não vos arrimeis a eles, porque podem roubar-vos algo da vossa razão e transmitir-vos a sua parvada. Deixai-os passeiar, falar, dançar e medrar no seu mundo. E se algum parvo chegar a ser autoridade não mostreis assombro, porque são cousas do sistema que combatemos e dos tempos em que nos quadrou viver.»
4. «Irmãos: Fugi sempre dos parvos. Não vos achegais a eles, porque podem roubar-vos algo da vossa razão e transmitir-vos a sua parvoíce. Deixai-os passear, falar, dançar e crescer no seu mundo. E se algum parvo chegar a ser autoridade não mostreis assombro, porque são coisas do sistema que combatemos e dos tempos em que nos calhou viver.»
5. «Irmãos: Fujam sempre dos parvos. Não se acheguem a eles, porque podem roubar-lhes (a vocês) algo da sua (de vocês) razão e transmitir-lhes (a vocês) a sua (deles) parvoíce. Deixem-nos passear, falar, dançar e crescer no seu mundo. E se algum parvo chegar a ser autoridade não mostrem assombro, porque são coisas do sistema que combatemos e dos tempos em que nos calhou viver.»
E deixo aqui uma frase (que tirei já não sei de que fonte galega) para mostrar que até a sintaxe da língua é a mesma, só que com as suas variações regionais:
«Mas então como adquirem o reintegrado as pessoas?» ― sintaxe galega
«Mas então como é que as pessoas adquirem o reintegrado?» ― sintaxe portuguesa
«Mas então como as pessoas adquirem o reintegrado?» ― sintaxe brasileira
as pessoas ― sujeito
adquirem o reintegrado ― predicado (verbo + complemento directo)
é que ― partícula expletiva
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