terça-feira, 8 de agosto de 2023

Outra pérola jornalística

― «GNR detém suspeito por fogo posto» ― in mediotejo.net, 01/08/2023.

Outra pérola jornalística: a GNR a pôr fogo! O que o jornalista queria dizer, certamente, era que a GNR deteve um suspeito de fogo posto, mas aquela frase parece indicar que foi a GNR que pôs fogo a qualquer coisa para, por esse meio, deter o suspeito!

Vejamos. A GNR (sujeito da frase) deteve (predicado) um suspeito (complemento directo, ou objecto directo). Até aqui tudo bem. Mas deteve o suspeito por quê, isto é, por que meio? Por fogo posto (complemento circunstancial de modo), isto é, utilizando o fogo posto. E o suspeito era suspeito de quê? Isso não podemos saber só ao ler aquela frase.

Énio Ramalho[1] é muito claro: «suspeito de: ele é suspeito do crime e a polícia anda no seu encalço». E o jornalista tem perfeita consciência disso, já que no corpo da notícia escreve «Um homem foi hoje detido pela GNR de Vila Nova da Barquinha, por suspeita do crime de fogo posto.» Foi detido por quê? Por suspeita. Por suspeita de quê? Do crime de fogo posto. Tudo correcto.

Eu, que vejo mal, sou suspeito de usar óculos ― não sou suspeito por usar óculos. Se fosse por usar, o usar óculos seria a prova de ser suspeito, o modo pelo qual se soubera que seria suspeito! Sou suspeito de usar óculos por ver mal.

― 

[1] Ramalho, Énio (1999) Novo Dicionário Lello Estrutural, Estilístico e Sintáctico da Língua Portuguesa. Lello Editores, Porto; p. 648.