segunda-feira, 17 de abril de 2023

Primeiros textos em galego ou português

Estes oito documentos manuscritos aparecem em várias fontes como contendo os textos mais antigos escritos originalmente em galego ou português, tanto quanto se conhece por ora.

• O pacto dos irmãos Pais (anterior a 15 de Abril de 1175)
• A notícia de fiadores (c. 1175)
• Ora Faz ost'o senhor de Navarra, cantiga de maldizer (c. 1200, por vezes é datado especìficamente de 1196 sem fundamento que o prove)
• A notícia de torto (c. 1214, entre 1211 e 1216)
• O testamento de Dom Afonso II (1214)
• A cessão do mosteiro de Armeses à condessa Dona Sancha Fernandes (1222)
• Foro do bom burgo de Castro Caldelas (1228, mas pode ser de c. 1275)
• Núcleo diplomático no mosteiro de Melom (1231)
[ref1ref2ref3ref4; ref5]

Mas a lista é mais vasta, basta seguir os trabalhos de José António Souto Cabo. De vez em quando encontra-se na Torre do Tombo mais outro documento dos inícios do século XIII ou mesmo do século XII, quer originário do Entre-Douro-e-Minho (ou arredores), quer da Galiza (ou arredores). A língua vernácula (que se falava corriqueiramente, diferente do latim que se usava para escrever) já estava perfeitamente formada, já era antiga, quando pela primeira vez se escreveu. E era (e é?) a mesma em ambas as margens do rio Minho, já lá dizia Ricardo Carvalho Calero (in Carvalho Calero Atual, Através Editora, 2012):
• "o galego é autóctono a ambas bandas do Minho" (1981, p. 95)
• "o galego era a língua oral e escrita aquém e além Minho" (1981, p. 97)
• "(...) o galego fosse suplantado polo castelhano numha parte do território em que se formou. Umha parte só, porque o galego se formou a ambas as beiras do Minho." (1986, p. 176)

Portanto, tanto faz chamar-lhe galego antigo como português antigo (e com mais propriedade se lhe devia chamar apenas galego). É interessante consultar os seguintes mapas:
• Mapa da área de repartição de origem da língua (das Astúrias ao Vouga, e não apenas até ao Douro), de Joseph Piel [ver, por exemplo, aqui]. NOGUEIRA, Carlos Filipe. O conceito geográfico-linguístico de Galécia Maior. In: Sete Ensaios sobre a Obra de J. M. Piel. Lisboa: Publicações do Instituto de Linguística da Faculdade de Letras de Lisboa, pp. 75-103, 1988.
• Mapa dos trovadores, de Monteagudo. MONTEAGUDO, Henrique. Nas orixes da lírica trobadoresca galego-portuguesa. In: O século de Xelmírez. Santiago de Compostela: Consello da Cultura Galega, pp. 387-437, 2013.

Pormenor do mapa da origem dos trovadores, de Henrique Monteagudo, citado acima.

Eis a transcrição dos primeiros quatro. Tentei marcar ― tanto quanto o meu amadorismo o permite ― as secções nìtidamente vernáculas (a letra preta normanda) no meio das latinas (a azul); tudo o que estiver em letra redonda balouça entre uma e outra com pouca nitidez.

PACTO DE IRMÃOS
Ego Gomenze Pelaiz facio a tibi irmano meo Ramiru Pelaiz isto plazo ut non intret meo maiordomo inilla villa super vostros homines deslo mormuiral. & de inde antre as casas d’Ousenda Grade & d’Elvira Grade. & inde pora pena longa & de ista parte per illa petra cavada de Sueiro Ramiriz dou vobis isto que sejades meo amico bono. & irmano bono & que adjuderis me contra toto homine fora el rei & suos filios. & si Pelagio Soariz. ou Menendo Pelaiz. ou Velasco Pelaiz. ou Petro Martiniz. Daquele que torto fezer a Don Ramiru. ou a Don Gomeze si quiser caber en dereito & se non ajudarmonos contra illos. Des illo mormoiral ata en frojom non laver {jure} mala Dos ergo illos que abet hodie fora se ganar herdade de gavaleiros ou de engeoida. & in vostra herdade habet tal foro quale dóóspital. & herdade for de penores & ibi morar suo dono dar calupnia & fosadeira & si se for dela abere tal foro quomodo vostros herdades. Se {homenem} entrar enaquela vila que torto tenia a Don Gomeze dar dereito dele si seu for de Don Ramiro {quen} de fora venia. & {quen} isto plazo exierit ad vos Ramiro Pelaiz se erar coregelo & se non {q} volverit peitar quinientos soldos. jsto pleito est taliado de isto maio que venit ad.IJs. anos.

NOTÍCIA DE FIADORES
Linha 1 →  Noticia fecit pelagio romeu de fiadores Stephano pelaiz .xxi. solidos lecton .xxi. soldos pelai garcia .xxi. soldos. Güdisaluo Menendice. xxi soldos
Linha 2 →  Egeas anriquici xxxta soldos. petro cõlaco .x. soldos. Güdisaluo anriquici .xxxxta. soldos Egeas Monííci .xxti. soldos [i l rasura] Ihoane suarici .xxx.ta soldos
Linha 3 →  Menendo garcia .xxti. soldos. petro suarici .xxti. soldos Era Ma. CCaa xiitia Istos fiadores atan .v. annos que se partia de isto male que li avem

ORA FAZ HOST'O SENHOR DE NAVARRA
"Ora faz host'o senhor de Navarra,,
pois em Proenç'est el-rei d'Aragom;
nom lh'ham medo de pico nem de marra
Tarraçona, pero vezinhos som,
nem ham medo de lhis poer boçom
e riir-s'-am muit'em dura edarra;
mais se Deus traj'o senhor de Monçon,
bem mi cuid'eu que a cunca lhis varra.
Se lh'o bom rei varrê'la escudela
que de Pamplona oístes nomear,
mal ficará aquest'outr'em Todela,
que al nom há [a] que olhos alçar:
ca verrá i o bom rei sejornar
e destruir atá burgo d'Estela,
e veredes Navarros lazerar
e o senhor que os todos caudela.
Quand'el-rei sal de Todela, estrẽa
ele sa host'e tod'o seu poder;
bem sofrem i de trabalh'e de pẽa,
ca vam a furt'e tornam-s'em correr;
guarda-s'el-rei, com'é de bom saber,
que o nom filhe luz em terra alhẽa,
e onde sal, i s'ar torn'a jazer
ao jantar ou se nom aa cẽa."

NOTÍCIA DE TORTO
1 D[e] noticia de torto que fecerun a laurencius fernandiz por plazo qve fece goncauo
2 ramiriz antre suos filios e lourenzo ferrnandiz quale podedes saber: e oue auer de erd[ade]
3 e d auer tanto quome uno de suos filios d aquanto podesen auer de bona de seuo pater; e fio li os seu
4 pater e sua mater. E depois fecerun plazo nouo e conuen uos a saber quale: in ille seem
5 taes firmamentos quales podedes saber. <E f...q> ramiro goncaluiz e goncaluo gonca[luiz e]
6 eluira goncaluiz forun fiadores de sua irmana que o[to]rgase aqu[e]le plazo come illos
7 Super isto plazo ar fe[ce]run suo plecto. e a maior aiuda que illos hic connocerun que les
8 acanoce<r>se laurenzo ferrnandiz sa irdade per plecto que a teuese o abate de sancto martino
9 que como uencesen o[ct]ra que asi les dese de ista o abade. E que nunqua illos lecxasen
10 daquela irdade d. sen seu mandato. Se a lexaren intregaren ille de octra que li plaza
11 E D auer que ouerun de seu pater nu[n]qua <le> li inde derun parte. Deu <a lauren....> dun goncalu
12 o a laurenco fernandiz e martin gonc[a]luiz xii <a> casaes por assas de sua auóó
13 E filarun li illos inde vi casales <quanto er> cun torto. E podedes saber como man
14 do Dun goncauo a sua morte. De xvi casales de ueracin que defructarun e que li
15 nunqua inde der[un] quinnon. E de vii e medio casaes antre coina e bastuzio unde li
16 nunqua derun quinion. E de tres in tefuosa unde li nu[n]qua ar der[un] nada. E iiºs in figeerec
17 do unnde nun<nada>qua li derun quinon. E iiºs in tamal unde li non ar derun quinon. E da sena
18 ra de coina unde li non ar derun quinon. E d uno casal de coina que leuarun inde iii anos
19 o frcuctu cun torto. E por istes tortos que li fecerun tem qua a seu plazo quebrantado
20 e qua li o deuen por sanar. E de pois ouerun seu mal e meteu o abade paz a[n]tre illes
21 inno carualio de laurecdo. E rogou o o abate tanto que beiso cun illes. E derun li
22 xviiii Morabitinos qui li filarun. E de pos iste plecto pre[n]derun li <on> o seruical otro
23 ome de sa casa. e troserun no xviiii dias per montes e fecerun les tan máá prison
24 per que leuarun deles quanto poderun auer. E de pois li desunro goncauo goncauiz
25 sa fili[a] pechena. E irmar[un] li xiii casales unde perdeu fructu. E isto
26 fui de pois que furun fijdos ant o abate. E de pois que furun infiados por iuizo de ilo
27 rec. E nunqua ille feze neu<n> mal por todo aqueste. E feze les <ta qua> agudas
28 quales aqui ouirecdes: Super sua aguda fez testiuigo cun goncauo cebolano
29 E super sa aiuda ar fui li a casa e filo li quanto que li agou e deu a illes. E super sa
30 aiuda oue testifigo cun petro gomez omezio que li custou maes <qua> Ka .c. Morabitinos
31 E super sa aiud[a] oue mal cun goncaluo gomez que li custou multo da auer
32 e muita perda. E in sa aiuda oue mal cun go[n]caluo suariz. E in sa aiuda
33 oue mal cun ramiro fernandiz que li custov muito auer muita perda.
34 E in sa aiuda fui iiªs fezes a coi[m]bra. E in sa aiuda dixe mul[tas] <f> uices
35 e ora in ista tregua furun a ueracin amazarun li os omes erma[run] li x casaes
36 seu torto al rec. E super sa iud[a] mandoc lidar seus omes cun mar
37 <M> tin iohanes que quir[i]a desunrar sa irmana. E cun ille e cun sa casa
38 e cun seu pam e cun seu uino uencestes uosa erdade. E cun ille
39 existis de sua casa in ipso die que uola quitarun. E ille teue a uosa
40 rezon. E otras aiudas multas que < >fez. E plus li a custado
41 uosa aiuda qua li inde cae d erdade. E subre becio e super
42 fíjmento se ar quiserdes ouir as desonras que ante ihc furun
43 ar ouide as: Venerun a uila e fila[run] li o porco ante seus filios e com
44 erun si lo. Venerun alia uice er filarun otro ante illes
45 er comerun s o. Venerun in alia uice er filiarun una ansar ante
46 sa filia er comerun s a. In alia uice ar filiarun li o pane ante
47 suos filios. In alia uice ar ue[ne]run hic er filarun inde o uino
48 ante illos
49 Otra uice uenerun li filar ante seus filios quanto que li agarun in quele
50 casal. E furun li <o> u ueriar e prenderun inde o conlazo unde mamou [?]
51 re e gacarun no e getarun in tera polo cecar e le[ua]run delle quanto oue.
52 In alia uice ar furun a feracin e prenderun iiºs omes e gacarun nos e leuarun
53 deles quanto que ouerun. In otra fice ar prenderun otros iiºs a se[u] irmano pelagio
54 fernandiz e iagarun nos. In otra ue[ne]run a [?]ge [?]tros e leuarun s o [?]
55 ante pelagio fernandiz

Sem comentários: