sexta-feira, 6 de setembro de 2024

«A ruína da Marinha nacional» (1808-1834) 2/2

Ver também a postagem «A Marinha Portuguesa nas Guerras Napoleónicas».

Isto é a parte 2 de 2 de uma transcrição quase na íntegra de um capítulo de António José Telo sobre a Marinha entre os fins do século XVIII e as guerras liberais. As enumerações vão em listagens, em vez do texto corrido original, para melhor visualização.

[ A R S E N A I S ]

«Portugal tinha ao seu dispor antes da independência do Brasil essencialmente três núcleos de arsenais: os do continente, do Brasil e da Índia. No continente, destacava-se pela sua importância o Arsenal da Marinha, em Lisboa, mas a ele podíamos juntar dezenas de arsenais privados, alguns capazes de contruir grandes navios, situados principalmente na zona do Porto, Viana, Aveiro e Figueira da Foz. No Brasil, o principal arsenal era o da Bahia, logo seguido pelo Pará, pelo Rio e por meia dúzia de outros de algum significado. Na Índia, contava-se principalmente com o arsenal de Damão.

Os arsenais do Brasil e da Índia tinham acesso fácil a madeiras raras, de excelente qualidade, que eram a matéria-prima mais difícil de obter para as contruções navais. A grande fonte destas madeiras eram as imensas florestas do Brasil, que alimentavam os arsenais da Bahia e do Pará e eram exportadas para Lisboa.

Qual a importância relativa destes centros em termos dos navios principais da Armada?Em fins de 1824 a situação era a seguinte: 
― as duas naus foram feitas em Lisboa; 
― as oito fragatas eram, 
• uma de Lisboa, 
• uma de Damão, 
• três da Bahia, 
• duas do Pará e 
• uma era presa capturada à França nas Guerras Napoleónicas; 
― das 10 corvetas, 
• quatro eram de Lisboa,
• uma de Damão,
• três do Pará/Bahia,
• uma presa capturada e
• um navio mercante convertido;
― dos 12 bergantins e brigues, só nos foi possível apurar a origem de nove, sendo
• dois feitos em Lisboa,
• dois na Índia,
• quatro no Brasil e
• um de contrução britânica.

Em resumo, nos 29 navios mais importantes da Armada dos quais foi possível apurar a origem (naus, fragatas, corvetas, bergantins e brigues),
• 9 eram do Arsenal da Marinha de Lisboa (31%),
• 4 da Índia (13%),
• 12 do Brasil (41%) e
• 4 (13%) eram de construção estrangeira, tendo vindo para a Armada quase todos como presas.

Temos assim a imagem de uma esquadra que dependia quase só dos estaleiros nacionais (25 navios dos 29 principais), mas onde o grande centro de construções era o Brasil, de onde provinham quase metade das construções (12 navios em 25 de origem nacional). Outra conclusão era que a construção naval nacional estava muito concentrada em somente quatro arsenais:
• Lisboa,
• Bahia, 
• Pará e
• Damão.
O Porto, Viana, Rio e Luanda só contribuíam com navios menores para a Armada, como escunas, charruas, iates, chalupas, cúteres e outros.

Com estes números é fácil entender a importância da independência do Brasil para o poder naval nacional. Ela representa a perda do centro de onde tinham vindo metade dos principais navios de origem nacional em 1824. É um golpe especialmente duro porque surge numa altura de decadência dos estaleiros nacionais, onde os brasileiros eram ainda os que melhor funcionavam, em parte porque a corte estava no Rio, mas em parte porque tinham recebido centenas de técnicos e artífices nacionais desde 1807, muitos provenientes das tripulações das naus que apodrecenam no Rio, sem voltarem ao mar.

O Arsenal da Marinha de Lisboa, o mais importante estabelecimento industrial nacional em começos do século, torna-se uma sombra de si próprio com as Guerras Napoleónicas. Antes, era capaz de construir uma média de duas naus e duas fragatas em cada três anos; depois de 1815, o Arsenal só inicia a construção de mais uma nau (a Vasco da Gama) e esta é um verdadeiro atestado à sua incompetência, pois, começada na carreira em 1824, só é lançada à água em 1841 e só arma em 1845 ― uns espantosos 21 anos depois de começada!  Escusado será dizer que a Vasco da Gama era obsoleta quando lançada à água, pois não incorporava nenhuma das novidades técnicas que se tinham desenvolvido nos estaleiros estrangeiros, mas eram impossível de aplicar nas condições da construção em Portugal.

Por outras palavras, não só o Arsenal da Marinha tinha passado de uma média de
• uma nau em cada ano e meio para 
• uma nau em 10 anos (a D. João VI) e, finalmente, 
• uma nau em 21 anos (a Vasco da Gama), 
como os navios aí construídos, apesar de se chamarem naus, tinham deixado de ser unidades de combate principal equivalentes tecnicamente às das marinhas europeias. A Vasco da Gama, aliás, passaria a maior parte da sua vida útil como depósito de marinheiros e as poucas viagens oceânicas que fez tendiam a correr mal.

O Arsenal da Marinha em Lisboa am 1793. Imagem retirada daqui.

Charles Napier deixou uma descrição pungente do que era o Arsenal da Marinha quando o dirigiu no começo da década de trinta [Charles Napier (1836) An account of the war between D. Pedro and D. Miguel, 2 vols., Londres]. É um testemunho precioso, proveniente do grande comandante naval deste período, que seria não só o principal chefe militar da vitória liberal em Portugal, como um dos reformadores da Royal Navy e um dos seus melhores almirantes entre 1820 e 1850. Napier compara o Arsenal da Marinha com os estabelecimentos congéneres ingleses e fica espantado com praticamente tudo: o imenso número de chefias incompetentes e ignorantes dos mais recentes desenvolvimentos das técnicas navais; os hábitos de trabalho dos Portugueses; a politização do clima do Arsenal e as perseguições contra os que não apoiavam a facção no governo; a falta de organização; o grau de exigência muito baixo; a constante improvisação, o que ainda era a melhor forma de solucionar os permanentes problemas; a interferência do ministro e das chefias superiores a todos os níveis; a falta de critérios de rentabilidade ou comerciais. Era um imenso choque cultural e de mentalidades entre Charles Napier e os hábitos prevalecentes no que, ainda em 1807, era um dos mais importantes arsenais da Europa. Escusado será dizer que o conflito acaba da única forma possível: Napier é afastado ao fim de pouco tempo da chefia do Arsenal, muito em especial quando começa a atacar os processos de preferências e privilégios políticos.

Ao ler a descrição que Napier deixou do que era o mais importante estabelecimento industrial nacional em 1834 é fácil entender como se passou de uma nau moderna em cada ano e meio para uma nau obsoleta em cada 21 anos, que ficava por um custo pelo qual se poderiam comprar pelo menos três naus modernas no estrangeiro. É também fácil entender como era possível que os navios nacionais não aguentassem manter o bloqueio da Terceira nos fortes mares dos Açores no Inverno, enquanto os da Royal Navy o faziam sem dificuldade de maior. Como Napier refere, para dar só um exemplo, as meras velas nacionais eram nesta altura de fraca qualidade e mal confeccionadas, a ponto de não aguentarem as rajadas de vento mais fortes, pelo que os oficiais as mandavam recolher assim que o tempo mudava, enquanto os navios ingleses podiam manter o pano em idênticas circunstâncias. Era a prova de que a qualidade é uma conceito global que, uma vez perdido em campos fundamentais, se estende rapidamente a outros, mesmo àqueles que dependem de técnicas tradicionais, que Portugal dominava desde há séculos, como era o caso da confecção de velas.

Para além da Vasco da Gama, a Marinha nacional só recebe em termos de navios principais (naus e fragatas) mais uma unidade nova até 1858: a fragata D. Fernando II e Glória, construída em Damão, a última «nau da Índia», actualmente preservada []. Das outras quatro fragatas aumentadas nestes anos, três eram antigos navios mercantes comprados pelos liberais na Inglaterra e transformados à pressa nos estaleiros estrangeiros em fragatas; a outra era a antiga charrua Maia e Cardoso, que seria classificada como fragata a partir de 1833. A ruína dos estaleiros nacionais não podia ser mais completa: no meio século posterior às Guerras Napoleónicas só produziram dois navios de combate significativos, mais concretamente uma nau obsoleta (Arsenal de Lisboa) e uma fragata de grande beleza mas duvidosa eficácia (Arsenal de Damão) [v. António Emílio de Ferraz Sachetti (1998) D. Fernando II e Glória, Lisboa, ed. CTT]

Referência
• António José Telo (2004) Portugal e a primeira vaga de inovação contemporânea. In Manuel Themudo Barata & Nuno Severiano Teixeira, Nova História Militar de Portugal, vol. 3, pp. 344-347.

quinta-feira, 5 de setembro de 2024

«A ruína da Marinha nacional» (1808-1834) 1/2

Ver também a postagem «A Marinha Portuguesa nas Guerras Napoleónicas».

Isto é a parte 1 de 2 de uma transcrição quase na íntegra de um capítulo de António José Telo sobre a Marinha entre os fins do século XVIII e as guerras liberais. As enumerações vão em listagens, em vez do texto corrido original, para melhor visualização.

[ N A V I O S ]

«(...) Portugal, quando as Guerras Napoleónicas começaram, tinha a sua marinha num ponto alto, tanto em termos de qualidade como de quantidade. Em 1791, alinhava uma força de
• 12 naus,
• 15 fragatas,
• 3 corvetas,
• 9 brigues, 
• 6 charruas
• e navios auxiliares,

a que havia a somar a marinha da Índia, com 
• 1 nau e 
• 7 outros pequenos navios [Números do subdirector da DGC do Ministério da Marinha, António do Nascimento Rosendo, no seu depoimento perante as cortes. Inquérito às Repartições da Marinha, tomo I, Lisboa, Imprensa Nacional, p. 425]

Era uma esquadra que correspondia a um terço da espanhola ou metade da holandesa, o que transformava Portugal num poder naval de terceira ordem muito razoável. O que era mais, esta força não só era numericamente substancial, como estava ao nível das equivalentes e conseguia operar sem desprimor ao lado da Royal Navy. Na primeira fase das Guerras Napoleónicas o país, a pedido da Inglaterra, cria duas esquadras que apoiam as operações britânicas nas principais frentes da guerra naval: 
― o canal da Mancha (força nacional de
• 4 naus,
• 1 fragata e
• 2 brigues)
― e o Mediterrâneo (força nacional de
• 5 naus,
• 1 corveta e
• 1 brigue).

Portugal, em resumo, tinha uma marinha muito razoável em termos numéricos, que era tecnicamente o equivalente a outras do seu tempo, que podia manter operações longe dos portos nacionais nos teatros mais exigentes e que era quase na totalidade de fabrico nacional e operada por nacionais. Era uma força naval oceânica, não no sentido de ser capaz de assegurar sozinha o controlo do Atlântico, mas no sentido de dar um contributo significativo para tal. A Armada servia principalmente para controlar uma rota oceânica (a do Brasil) e podia operar ao lado da Inglaterra nos principais teatros de operações navais, onde a guerra era mais exigente, tudo capacidades que se iam perder a curto prazo.

Em 1807, quando a corte retira para o Brasil, todos os navios capazes de navegar a acompanham. A esquadra que transporta os 15 000 portugueses era formada por 40 navios mercantes, escoltados por
• 8 naus,
• 5 fragatas,
• 4 brigues,
• 1 charrua e
• 1 escuna nacionais, 

para além de três naus britânicas. Ao mesmo tempo, o comboio anual do Brasil que estava a chegar ao reino, formado por mais umas dezenas de velas, é desviado para Londres e já não descarrega os produtos que transporta em Lisboa. Na capital só ficam os navios incapazes de navegar ou os que não foi possível armar a tempo, o que é ainda uma força razoável de
• 4 naus,
• 6 fragatas,
• 1 corveta,
• 1 brigue e
• 1 charrua.

A Marinha portuguesa em 1807 estava, em resumo, ao mesmo nível do começo das Guerras Napoleónicas, em 1791, com 12 naus (mais uma na Índia) e 11 fragatas como unidades principais.

Em poucos anos, esta força vai desaparecer como se tivesse sido tragada pelos mares numa imensa batalha, apesar de nenhum navio principal ter sido perdido em combate. Quando a corte chega ao Brasil, os navios que a transportaram eram inúteis, não podiam voltar ao reino e custava muito caro mantê-los armados, numa altura em que as dificuldades financeiras eram imensas. A Inglaterra, que se mostrava disposta a financiar o Exército português a partir de 1808, não fazia o mesmo em relação à Marinha, pelo simples mas inapelável motivo de que não precisava de mais navios depois da vitória em Trafalgar. O que é mais, a principal função da Marinha nacional desaparece, pois os portos do Brasil são abertos ao comércio internacional e não é mais necessário fiscalizar essa linha vital atlântica da qual dependia a prosperidade do Estado central do Antigo Regime. A Marinha inglesa era suficiente para proteger a navegação que sai do Brasil, até porque esta segue principalmente em navios de bandeira britânica que se dirigiam para Londres depois de 1808.

É de notar que, quando a corte chega ao Brasil, são abertos de imediato os seus portos à navegação aliada e, em poucos meses, estabelecem-se mais de 200 casas comerciais britânicas. Os tratados assinados com a Inglaterra em 1810, numa altura em que a dependência em relação ao apoio britânico para combater o invasor francês era máxima, apontam para uma clara inserção do eixo Portugal-Brasil num Atlântico dominado pela Inglaterra. As mercadorias inglesas no Brasil, por exemplo, pagavam direitos inferiores às nacionais, o que corta com qualquer veleidade de afirmação de uma actividade manufactureira nesse território. A contrapartida muito importante era a garantia dada pela Inglaterra de que defendia a integridade do território e a manutenção da Casa de Bragança.

Reconstituição da chegada ao Rio de Janeiro em 1808. Quadro de 1999 por Geoffrey Hunt (n. 1948), artista contemporâneo de temas navais; adaptado com os nomes dos navios.

Neste contexto, é compreensível que a corte tenha decidido desarmar a quase totalidade das naus e das fragatas e dispensar grande parte dos oficiais das suas guarnições. Os navios seriam mantidos inactivos durante longos anos ancorados na Ilha das Cobras (Rio de Janeiro). Na sua maioria apodreceram rapidamente no clima tropical. As naus portuguesas que ainda navegam são as que ficaram em Lisboa, que Junot mandou recuperar à pressa na ilusão de as poder utilizar contra os navios britânicos, que, em grande número, asseguravam o bloqueio permanente dos portos nacionais. Mesmo essas naus, porém, são desarmadas quando Junot é expulso de Portugal em 1808. 

Em Agosto de 1810 só uma nau está armada e navega (a Vasco da Gama), isto para uma marinha que ainda três anos antes alinhava 13 naus. A missão dos poucos navios portugueses operacionais no continente é essencialmente a de manter a esquadra do estreito, que protegia a navegação contra os corsários berberescos. No Brasil uma força apoiava as operações terrestres que a corte desencadeou contra as colónias francesas e as antigas colónias espanholas, mas formada somente por pequenos navios, pois as naus e fragatas não tinham utilidade numa guerra que era essencialmente costeira.

Das oito naus que partem de Lisboa em 1807 só uma regressa ao reino (a Rainha de Portugal). A maior parte das outras será abatida devido à deterioração, depois de longos anos de imobilização. Mais importante ainda era o facto de nestes anos (1807 a 1824) só se ter fabricado uma nau em Portugal (a D. João VI) e, mesmo assim, com grandes dificuldades, pois seria começada em 1806 e lançada à água dez anos depois, em 1816. 

A independência do Brasil 1822 é mais uma terrível machadada nesta força já muito debilitada. A maior parte da marinha que estava no Brasil adere à causa encabeçada por D. Pedro e, fortalecida por oficiais britânicos voluntários [O Brasil contratou logo a seguir à proclamação da independência os serviços de um almirante, quatro capitães-de-fragata, um capitão-tenente, 13 primeiros-tenentes e 10 segundos-tenentes britânicos. Cf. Esparteiro, 1974-1988, vol. 7, 162.], impõe-se sem grandes dificuldades aos restos da Marinha portuguesa que tinha perdido a capacidade de controlar os oceanos. Portugal passa mesmo pela vergonha de, para além de não conseguir enviar nenhuma expedição significativa para o Brasil, perder 15 dos 40 navios mercantes do comboio no qual retiram as tropas fiéis a Lisboa, perante uma força naval menor, mas comandada por oficiais ingleses, que têm à sua frente lorde Cochrane.

Em 1824 Portugal só conta com
• 2 naus,
• 8 fragatas e
• 10 corvetas.
Só uma das naus está armada (a D. João VI, com oito anos), pois a outra (a Rainha de Portugal) está em mau estado e desarmada; a nau D. Sebastião é irrecuperável para o serviço da esquadra, pelo que não a contamos. Significa isto que a Marinha portuguesa de 1824 é equivalente a um terço da força existente em 1807 em termos de homens e toneladas. A perda qualitativa é muito mais importante, pois passou-se de uma esquadra com 13 unidades de combate principal (as únicas que contam em termos de controlo dos oceanos) para outra com duas, das quais só uma estava em boas condições. Portugal tinha perdido a capacidade de manter uma força oceânica significativa e não mais a recuperaria posteriormente. A partir de agora a Marinha nacional seria uma força costeira e de projecção imperial, só capaz de exercer uma acção de controlo dos oceanos em termos costeiros nas lutas internas (e esta é muito importante para a evolução nacional), mas incapaz de contribuir de forma significativa para o controlo global dos oceanos, o que foi a sua missão principal no primeiro período das Guerras Napoleónicas.

O que se tinha perdido sobretudo não eram os navios apodrecidos e os oficiais dispensados do serviço, pois estes eram recuperáveis, embora os primeiros fossem mais fáceis de substituir que os segundos. O que se tinha perdido era muito mais vasto. O que se tinha perdido era o acesso às fontes de matérias-primas e aos estaleiros vitais do Brasil, para os quais passaram em 1807 os melhores técnicos portugueses, bem como os lentes em peso dos estabelecimentos de ensino da Marinha; o que se tinha perdido era um Estado central forte e financeiramente são, que pudesse incentivar o desenvolvimento da base do poder naval; o que se tinha perdido, e isto era, sem dúvida, o mais importante, era a capacidade de acompanhar a evolução técnica internacional, justamente na altura em que esta passa a ser muito rápida e dá um imenso pulo qualitativo sob o impulso da Revolução Industrial.»

Referência
• António José Telo (2004) Portugal e a primeira vaga de inovação contemporânea. In Manuel Themudo Barata & Nuno Severiano Teixeira, Nova História Militar de Portugal, vol. 3, pp. 344-347.

segunda-feira, 26 de agosto de 2024

Mais Ligações Desalojadas

Ver também as postagens «Lista de Bookmarks» e «Ligações Desalojadas».

Aqui ficarão, nostalgicamente, ligações que vou desalojar da lista à direita e do blogalelepípedo porque não são actualizadas há mais de um ano, ou porque já desapareceram em absoluto.

domingo, 25 de agosto de 2024

Georg Vogel toca Georg Voguel, num Clavemusicum Omnitonum

«Vonamoe», de Georg Vogel. O instrumento é um Clavemusicum Omnitonum, variante do arquicímbalo ou arquicravo, instrumentos de tecla afinados para a microtonalidade, isto é, que permitem tocar quartos-de-tom e outros intervalos inferiores ao meio-tom. 

https://www.youtube.com/watch?v=wZ7rMsE1ia8

«Though microtonal music may seem modern, this harpsichord is based on an original instrument by Vito Trasuntino, 1606, currently located at Museo Internazionale e biblioteca della musica di Bologna. Studio31 has also made instruments with 36 and 24 keys per octave.» ― diz um dos comentários ao vídeo. 

segunda-feira, 22 de julho de 2024

«O artigo científico está obsoleto», diziam eles...


No dia 7 de Abril de 2018, o meu amigo Carlos Afonso mandou-me um link para um texto que tinha aparecido dois dias antes na histórica revista norte-americana The Atlantic

O texto era assinado por James Somers e trazia o seguinte título: The Scientific Paper Is Obsolete. Here's What's Next (ainda está em linha: https://www.theatlantic.com/science/archive/2018/04/the-scientific-paper-is-obsolete/556676/).

Estou a falar nisto agora porque encontrei por acaso o e-mail que escrevi imediatamente em resposta ao meu amigo. Vale a pena transcrevê-lo aqui, porque mostra uma opinião que eu continuo hoje a subscrever sobre um tópico que continua a ser incompreendido.

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Obrigado. É longo, não tenho tempo agora para ler isso tudo, mas muita coisa há a dizer sobre o tópico. O que posso comentar desde já, depois de ter skimmed through, é que quem escreve coisas com este título assume que a única função de um artigo científico é comunicar novos resultados, quando essa é apenas uma das suas funções. Para já, existem muitos tipos de artigos científicos (research papers, short comms, opinions, digests, letters, etc.) e depois (e hoje em dia principalmente) os artigos servem para pôr no CV, dar estatuto profissional aos autores, obter grants, mostrar produção, etc. Pode-se não gostar desta função, mas ela existe, é um facto do «fazer Ciência» moderno. 

Outra função é a da narrativa: dependendo na disciplina, é mais ou menos preciso escrever um paper com uma narrativa, i.e., justificar um resultado, uma interpretação, uma opinião, uma abordagem. Raramente basta apenas mostrar os novos resultados ou o novo método: é quase sempre preciso interpretá-los, e eu sou daqueles que acha que é aqui, depois dos resultados ― ou mesmo apesar dos resultados, in spite of the results ― que começa a Ciência com maiúscula. 

Outra questão é considerar que a Ciência deve ser feita com base nas ideias positivistas de progresso e generalização, o que significa que conseguir mais resultados e mais depressa é melhor do que obter menos resultados e parar para pensar sobre eles. Como se «fazer Ciência» valesse por si só (Ciência como ideologia ou mesmo religião) e não como um conjunto de métodos racionais para chegar ao Conhecimento (ideias iluministas, o primado da Razão, sem pressas: Buffon demorou 40 anos a escrever a sua Histoire Naturelle em 36 volumes, e quando morreu deixou material preparado para mais oito volumes!

Enfim, como vês, eu tenho opinião sobre o assunto, e um dia hei-de escrever um paper sobre isto ― ou pelo menos um post no meu blog.

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E cá estamos. Mais de seis anos depois e sem ser exactamente uma postagem alargando o tópico para além do e-mail, mas cá está.

sexta-feira, 12 de julho de 2024

Citações da esquerda britânica original

"While industry was on a small scale masters and men were intimately acquainted with each other, and there was little need of intervention from outside; there was no place for factory inspection, and little possibility of combined action on the part of the workers. In a small society custom and public opinion are enough to regulate the relationships between man and man in the ordinary affairs of life in accordance with elementary ideas of justice."
― Clement Attlee, The Social Worker (1920), p. 7.

"(...) a large amount of charitable work done with the principal object of benefiting the soul of the giver, the effect on the welfare of the recipient being of a secondary consideration. (...) in so far as the object [of Charity] is the good of the benefactor rather than that of the beneficiary it is very far from the social service idea."
― Clement Attlee, The Social Worker (1920), p. 8.

"(...) numerous benefactions which are given in order to quiet the mind from uneasiness at the sight of wretchedness, or to satisfy a queasy conscience that, recognising that all is not well, endeavours to obtain a cheap insurance against disturbing thoughts, or a mild glow of satisfaction at the feeling that some good has been done, and that gratitude has been merited."
― Clement Attlee, The Social Worker (1920), pp. 8-9.

"The old incentive to charity that we find in the mediæval church became weaker when at the Reformation the doctrine of salvation by faith caused less stress to be laid on works (...)"
― Clement Attlee, The Social Worker (1920), p. 9.

"Society as constituted was accepted, and the existence of the poor taken for granted, nay even welcomed as providing an outlet for the benevolence of the rich. Charity is always apt to be accompanied by a certain complacence and condescension on the part of the benefactor, and by an expectation of gratitude from the recipient which cuts at the root of all true friendliness. The charitable of the time [late 18th and 19th centuries] seem to us to-day to be smug and self-satisfied. They delighted in sermons to the poor on convenient virtues, and lacked that sharp self-criticism that is the note of society to-day."
― Clement Attlee, The Social Worker (1920), pp. 9-10.

"Where formerly it was considered that the State was a sort of referee who kept the ring wherein contending individualities had full scope for contest, we now have the conception that it is the duty of the State to act as the co-ordinating factor in making all individual efforts work for the good of the citizens."
― Clement Attlee, The Social Worker (1920), p. 18.

terça-feira, 25 de junho de 2024

Ben Nacar toca Edward Elgar

https://www.youtube.com/watch?v=xliRHaU4Ei4

Pomp and Circumstance March no. 1 de Edward Elgar

Ben Nacar, piano (arranjo para piano do próprio Ben Nacar)